2005-01-08

 

Humor numa terra estranha

O post do José Luis Peixoto sobre a desumanidade de piadas baseadas na tragédia do sudeste asiático lembrou-me um dos livros que mais marcou a minha adolescência: O Stranger in a Strange Land de Heinelein. O tal que pode ser visto como uma recontextualização pós-moderna de Jesus Cristo.

Neste livro, o Messias Marciano chamado Mike descobre que a faculdade de rir é o que nos torna humanos. Mike demora bastante tempo a perceber o humor. Descobre-o um dia ao reparar no ciclo trágico de violência e crueldade que caracteriza o comportamento dos animais mais avançados do planeta (ele descobre isto ao ver macacos a lutar num Jardim Zoológico). Mike então conclui que a faculdade de rir sobre a tragédia é um mecanismo de sobrevivência necessáriamente humano, porque os humanos são os únicos animais com a capacidade de imaginar. É porque temos consciência e podemos imaginar o horror que temos mesmo necessidade de rir.

Supostamente, quanto mais avançada uma sociedade, menor seria a necessidade de rir -- por haver menor necessidade de imaginar o pior. O que o maremoto/tsunami do sudeste asiático mostra é que a tragédia natural pode ocorrer a qualquer altura sem descriminação dos mais ou menos eticamente avançados.

O rir tem então de ser o melhor remédio. Onde eu não consigo concordar com Heinelein (talvez não o consiga grokar) é por não perceber porquê que o rir tem de ser da tragédia que nos aflige directamente. Concordo completamente com o Peixoto a um nível emocional: não consigo, e acho repugnante, rir desta tragédia. Mas que tenho necessidade de rir para lidar come ela tenho. Rir doutras coisas, rir essencialmente de mim mesmo, mas tenho de rir para poder manter a minha sanidade e humanidade na face de tal tragédia.

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