2010-05-09

 

Responsabilidade e Vítimas


Com a visita Papal a Lisboa esta semana, não há comentador que não fale da crise que a Igreja enfrenta por causa da pedofilia nas suas estruturas. Aliás, com ou sem visita, o assunto está por todo o lado. Não querendo obviamente defender as acções da Igreja nas últimas décadas neste caso, não posso deixar de me surpreender com o ataque cerrado à Igreja sem nenhuma réstia de mea culpa por parte da sociedade em geral. Nem se trata apenas da ideia que tenho de que a pedofilia não deve ser maior nas estruturas eclesiásticas do que em qualquer outra estrutura social bastante hierárquica, autoritária e essencialmente formada e dominada por um único género, normalmente o masculino---Colégio Militar, Casa Pia, anyone? Aliás gostaria de ver estatísticas sérias sobre isto.

Os casos de pedofilia de cariz homossexual que tanto têm aparecido nessas tais estruturas sociais (especialmente em Portugal) são um problema da sociedade como um todo, e não só da Igreja---que é apenas um componente inserido numa sociedade. Atacar agora a Igreja como a grande detentora desse problema, é uma grande hipocrisia da parte de todos nós e não passa do tradicional bode expiatório para esconder a cobardia colectiva. A pedofilia homossexual é aparentemente endémica nessas estruturas hierárquicas, porque ser vítima de tal abjecto crime tem sido para a nossa sociedade um grande motivo de vergonha e desonra individual, por vezes pior do que ser o próprio criminoso. Uma sociedade homofóbica, de facto, cria um incentivo ao silêncio das vítimas, especialmente quando estas se encontram nos níveis mais baixos do poder em hierarquias autoritárias como o Colégio Militar, a Casa Pia e a Igreja. Desse prisma, na realidade, a Igreja tem muitas culpas por ser um grande motor da homofobia---se eu quisesse ser cínico, diria que aos pedófilos homossexuais no seio da Igreja (e nas estruturas militares e outras), convém e muito manter um alto nível homofobia na sociedade, para manter as vítimas caladas...

A este grande factor juntam-se outros que nos deveriam fazer repensar as nossas atitudes, em vez de nos juntar à grande multidão que quer atirar Bento XVI para fogueira. Quem nunca notou que há algo de esquisito na forma como a nossa sociedade escolhe os homens que vão para Padres? Quantas mães não encaminharam os seus filhos mais “sensíveis” para o celibato caduco da Igreja? Naturalmente a Igreja tem muito trabalho de reflexão pela frente, mas de nada adiantará se a sociedade em geral, e a comunidade católica em particular, não participar nessa reflexão como parte integrante do problema, e não simplesmente para atirar a primeira pedra.

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Comments:
Parabéns pelo olhar crítico de seu texto. Achei-o muito acurado no que disse e no que desvela, quanto à homofobia da sociedade refletida na Igreja Católica, e cá no Brasil em tantas outras religiões cristãs. Mais uma vez, parabéns!
 

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