2024-02-02
Polimedicação é pior em idosos e mulheres, mas pode-se melhorar com análise de dados
Artigo publicado: L.M. Rocha [2024]. Polimedicação é pior em idosos e mulheres, mas pode-se melhorar com análise de dados. Público . January 31, 2024.
Alexandra Campos
publicou recentemente no Público uma reportagem muito interessante sobe o
problema da polimedicação em Portugal. Ficámos a saber que mais de um terço da população acima dos
65 anos toma mais de cinco medicamentos simultaneamente–o que remete Portugal para
o topo dos países com este problema na Europa (só atrás da Republica Checa e
Israel que também participou neste estudo europeu).
Um dos grandes
problemas da polimedicação é que os medicamentos são muitas vezes receitados
por médicos de especialidades e até de sistemas de saúde diferentes, que não
recebem alertas sobre outros medicamentos já receitados ao mesmo paciente. Além
disso, frequentemente os médicos não estão cientes das muitas interações
nocivas entre os vários medicamentos que são conhecidas, estabelecidas
cientificamente e publicadas em bases de dados públicas–não se trata sequer de
potenciais interações desconhecidas que obviamente não podem ser usadas como alertas,
mas cujo risco aumenta com polimedicação.
O nosso grupo de
investigação tem-se especializado em analisar o problema das interações nocivas
na polimedicação, com projetos patrocinados nos últimos 10 anos pelos National Institutes
of Health nos EUA e também a nível nacional pela Fundação para a Ciencia e Tecnologia (FCT). Para perceber a escala do problema das interações medicamentosas,
avaliámos os cuidados primários em populações distintas de três continentes: 133 mil pacientes da cidade de Blumenau no Brasil (Estado de Santa Catarina), 5,5 milhões de pacientes na Catalunha e
250 mil pacientes do maior sistema de saúde privado da cidade de Indianápolis nos EUA (Estado de Indiana). Apesar de
diferenças entre os vários sistemas de saúde–por exemplo, o formulário do sistema publico de Blumenau só inclui 140
medicamentos enquanto o sistema privado de Indianápolis inclui mais de mil–,
ficou bem claro que em todos estes sistemas as mulheres têm bastante maior
risco de lhes serem receitadas interações conhecidas, algumas muito nocivas.
Em relação a idosos, o
problema é ainda bem maior do que descrito na reportagem do Público. De facto, o
nosso último estudo (ainda em avaliação em revista científica) mostra que se os médicos
prescrevessem medicamentos aleatoriamente nas mesmas proporções, seriam
receitadas menos interações medicamentosas prejudiciais do que os números reais.
Isto é, os idosos (de ambos os sexos mas pior para mulheres) estão
potencialmente mais expostos às complicações da polimedicação do que se fossem
tirar medicamentos das prateleiras ao calhas!
Uma vez que Portugal tem maior proporção da sua
população em polimedicação do que Espanha, este problema deve ser ainda maior por cá, só
que não sabemos por não haver disponibilização desses dados. É importante
frisar que a análise desses dados leva à descoberta e recomendação de ações
especificas que podem melhorar a saúde e reduzir os custos de saúde publica. No
nosso estudo, descobrimos que se o sistema de saúde catalão substituir um único
medicamento (Omeprazole, inibidor da bomba de protões para tratamento de
refluxo gástrico) por outros medicamentos semelhantes, o risco de ser receitada
uma interação na polimedicação nesta população reduz-se em 23% para mulheres e
20% para homens, reduzindo significativamente também a diferença entre sexos
neste problema–com a substituição de um único medicamento!
A recomendação
dessa ou de outras substituições poderia ser facilmente implementada com a
introdução de um sistema de alerta robusto, na prescrição, nas farmácias ou no
acompanhamento de cada paciente. Além de melhorar a saúde dos pacientes, o que
deve ser o principal objetivo ético, a redução dos problemas inerentes à
polimedicação – especialmente numa população envelhecida – pode certamente
levar também à redução de custos. Uma estimativa conservadora que fizemos da hospitalização por interações medicamentosas,
conclui que os seus custos no estado brasileiro de Santa Catarina (população 7
milhões bem mais jovem que a de Portugal e com menos medicamentos disponíveis) ascendem
a entre 21 a 61 milhões de dólares americanos por cada 18 meses .
Contruir alertas para possíveis interações ou reações adversas em polimedicação não só é relativamente fácil de fazer, como imensos sistemas de saúde os têm. Uma vez que existe um sistema nacional de códigos de prescrição, é também possível fazer um sistema nacional de alertas integrativo para médicos no ato da prescrição, farmácias no ato da venda ou no acompanhamento de pacientes por gestores de saúde publica. No caso das interações e reações mais perigosas conhecidas, uma receita deveria acionar um alerta para que o médico confirme a necessidade de prescrever um medicamento que se sabe causar potenciais problemas graves na presença de outros já prescritos ao mesmo paciente (de que o médico pode nem estar ciente), bem como a recomendação automática de alternativas. Também o próprio paciente deveria receber alertas, já que os folhetos informativos de cada medicamento são normalmente de difícil compreensão. Preocupamo-nos muito com a privacidade dos dados, mas pouco com a ética de se prescrever polimedicação sem informar pacientes de potenciais problemas associados.
Em Portugal, mesmo contactando as entidades responsáveis ao abrigo de projetos da FCT especificamente desenhados para se utilizar a ciência de dados e a inteligência artificial na administração pública, é muito difícil obter dados de prescrição médica para investigação científica. De facto, é muito difícil saber qual a verdadeira escala deste problema, muito menos implementar mecanismos para melhorar os resultados e custos de saúde associados–ao contrário da Catalunha e Dinamarca que disponibilizam estes dados sobre toda a sua população durante décadas. Seguindo esses exemplos excelentes (que utilizam todas as normas europeias de privacidade e segurança) na utilização de dados ao serviço do bem-estar da população, está mais do que na hora de se levar a sério o problema da polimedicação, disponibilizando os dados de prescrição nacionais com vista à implementação de ações especificas para melhor servir a saúde publica nacional.
Labels: #Pharmachology, #portugal, #Research
2021-01-20
Lixívia ideológica não resolve a pandemia
Publicado em Público, 20 de Janeiro de 2021.
Quando a pandemia chegou em força notou-se um novo apreço na sociedade em geral pela matemática e ciência. Infelizmente esse apreço foi uma oportunidade perdida para integrar cientistas mais seriamente na decisão política. Aliás, nem se quer os média mudaram muito nesse aspeto. Fala-se muito na vantagem de haver diversidade de pensamento, mas quantos comentadores com formação científica vêm nos programas e páginas de opinião na televisão e jornais de referência? Não defendo a inclusão de mais pensamento científico na governação e discussão pública para autopromoção. A questão é que estes poderes fundamentais da democracia ignoram as recomendações científicas em detrimento de posições ideológicas.
O governo e
presidente—com o apoio da maioria dos comentadores e editoriais nos média e de
quase todos os partidos—têm ido sistematicamente e sucessivamente contra as
recomendações dos seus próprios cientistas. Olhando só para os últimos meses:
1) em vez de confinar em Novembro para poder relaxar mais no Natal como outros
países fizeram, o governo optou por relaxar no Natal e Ano Novo mesmo com um
numero de casos diários por milhão quase cinco vezes maior do que no pico de
Março/Abril; 2) depois deste relaxamento que se saberia ir aumentar a
transmissão comunitária, o governo abriu imediatamente as escolas e locais de trabalho
no inicio de Janeiro esperando 10 dias para reunir com o Infarmed; 3) vendo o
resultado péssimo das duas decisões anteriores, o governo apostou a dobrar num
confinamento light com escolas abertas, contra a recomendação científica
de fechar escolas para os alunos com mais de 12 anos−sabendo de novas variantes aparentemente capazes de maior
propagação em jovens.
Pois aí está a realidade: hoje Portugal é o país europeu com maior numero de
casos por milhão de habitantes−mesmo com o aparente teto falso devido à limitada capacidade de
testagem!
É importante
notar que estas decisões políticas contra as recomendações científicas têm sido
amplamente defendidas pela intelligentsia nacional. Já nem falo da
ridícula e nociva obsessão com o “modelo Sueco” há muito desacreditado pela
ciência e até pelo próprio Rei e governo sueco−uma obsessão tanto da esquerda como da direita que, não se percebendo porquê, parecem focar-se na
Suécia em vez dos países democráticos da Ásia-Pacífico que melhor responderam à
pandemia. Mas o caso de se manterem todas as escolas abertas na conjuntura
atual é particularmente ilustrativo. O consenso científico é claro: com o que
se sabe do SARS-CoV-2 e suas variantes, quando a transmissão local é elevada
como é o caso Português, deve-se fechar as escolas exceto para crianças mais
novas. Foi essa a recomendação dada ao governo pelos seus
próprios cientistas.
Mas o governo
optou por uma opção política de manter abertas todas as escolas, incluindo
universidades. Um opção amplamente defendida pela generalidade dos comentadores. Os fundamentos apresentados são essencialmente
ideológicos sobre o papel da escola pública na sociedade. Fora do contexto da
pandemia, concordo completamente com essas considerações ideológicas para evitar
lacunas na aprendizagem que agravam a desigualdade e custos futuros para os
jovens. Mas a realidade é a que temos, não a que gostaríamos de ter. Lutar
contra ela com argumentos ideológicos é algo como lutar contra a lei da
gravidade porque se acha que todos devem ter o direito de voar como os
pássaros. Lembra-me quão nocivo foi Trofim Lysenko na União Soviética e China por achar que era a
biologia que se devia vergar ao conceito estalinista e maoista de que os seres
vivos podem ser infinitamente transformados pela reeducação. Descobriu-se, com milhões a morrer de fome, que não se “educa” bananas a crescer na
Sibéria. Aqui descobre-se que nem tampouco vai o SARS-CoV-2 (e variantes)
respeitar princípios da escola pública, fronteira aberta, etc. Aliás, o
descontrolo epidemiológico só aumenta a probabilidade de o vírus evoluir para estirpes não
controladas pelas vacinas, o que seria a maneira mais sinistra da realidade se rir no fim−reality
bites, diz-se em Inglês.
É importante
também perceber que o governo e demais intelligentsia argumentam com
falsidades a decisão de manter todas as escolas abertas. Afirmam que não há
transmissão nas escolas, mas ao mesmo tempo assumem que não se sabe a origem de 87% dos contágios e o ministério da educação não publica os
dados de infeções nas escolas. Ao contrário de Portugal, a maioria dos países europeus fechou as
escolas, primeiro porque os dados mostram que transmissão ocorre nas escolas em
idades mais avançadas e segundo porque ter as escolas abertas obriga a uma
movimentação de grande parte da sociedade que mais transmite o vírus. Mas a
arrogância algo provinciana do governo e defensores é ter fé que a natureza e
sociedade se comportarão de maneira diferente em Portugal.
Naturalmente que
passar as aulas para um regime online tem custos. Mas o custo de as manter
abertas não é só um inaceitável número de mortes. Há também um impacto na própria
economia por termos agora em mãos uma situação de rotura que só tornará ainda
pior todas as desigualdades que os proponentes de se manterem as escolas
abertas queriam evitar. É importante dizer-se que o Ministério da Educação teve
a primavera, verão e grande parte do outono para preparar o sistema educacional
Português para esta vaga de inverno que se sabia que viria. Deveria ter
identificado as formas de minimizar as desigualdades inerentes ao ensino
online, nomeadamente providenciando recursos informáticos a quem precisa, treinando
o corpo docente, ou mesmo estabelecendo regimes heterogéneos de aprendizagem
(alguns na escola outros em casa). Esta falta de flexibilidade e incompetência
é agora ofuscada por um posicionamento de superioridade ideológica em relação a
outros países que fecharam as escolas. Mas não há nenhuma razão para que o
ensino online não tenha sido melhorado para colmatar muitos dos problemas
observados no primeiro confinamento geral.
No final das
contas, a não integração do conhecimento científico na governação e discussão
pública sai caro demais. É um posicionamento anticientífico não assumido. Em
última análise e na prática, não acatar as recomendações científicas (como
fechar as escolas a partir dos 12 anos) não é diferente de recomendar injeções
de lixívia, homeopatia, ou mesmo ser anti vacina. Só que o governo português
nem com um dos resultados piores da Europa recebe dos média a crítica que
compete a um quarto poder; antes pelo contrário, a intelligentsia
aprova. A pandemia demonstra mais uma vez que se pode ignorar, mas não fugir da
realidade−e quanto mais se ignora, menos se consegue fugir.
Figura 1: Mortes diárias por milhão de habitantes (média a
7 dias). Curvas de alguns países com notoriedade a ignorar o consenso
científico (EUA, Brasil, Suécia, Portugal) versus a média da EU e os países que
melhor responderam à pandemia.
Figura 3:Mortes por casos de COVID-19 por milhão de habitantes. Eixo vertical (mortes por milhão) em escala logarítmica; Taiwan com 0.3 mortes por milhão de habitantes, Portugal com 870 e Bélgica com 1756 mortes por milhão de habitantes Eixo Horizontal (casos por milhão) em escala linear; Taiwan 36 casos por milhão, Portugal com 54000 e República Checa com 83000 casos por milhão de habitantes.
2018-05-05
Clubismo na Ciência e as paredes disciplinares
Labels: #Interdisciplinarity, #portugal
2018-03-25
Labels: #HipHop, #Music, #portugal
2017-11-02
Ilustres Professores
Labels: #portugal, #universidades
2017-01-16
Soares e os retornados, ou como o Branco-de-Segunda dá em Vaca Profana
Tendo sido um retornado, refugiado da Guerra Civil de Angola, deixem-me dar um contraponto a esta unanimidade de comentário jornalístico; explicar porque sempre me senti uma vaca profana em Portugal nestes assuntos. Primeiro, digo logo à partida que não considero Mário Soares o grande culpado da descolonização---que foi nada, mesmo nada, exemplar. No entanto, como é obvio pelas cerimónias fúnebres da semana passada, ele é o grande símbolo da democracia Portuguesa que engendrou a descolonização após o 25 de Abril. Como tal, é natural que nos seus ombros se deposite simbolicamente tanto os louvores como as mágoas do regime presente e da sua história recente.
Pelo menos desde o século XIX que os Portugueses nas colónias não foram considerados como cidadãos Portugueses autênticos. A opinião destes "brancos-de-segunda" (eu nasci com essa designação que impedia acesso como igual às instituições militares, sociais, económicas e politicas portuguesas) nunca foi fator importante nas decisões dos senhores da grande quinta imperial que mantinha Portugal; eram apenas os trabalhadores dessa quinta. Muito menos contou a opinião da população considerada indígena africana cuja diversidade a Europa e América do século XIX e XX nunca compreenderam---considerando todos como negros e mestiços, nunca percebendo que há muito maior diversidade racial dentro de África do que fora dela.
O grande problema de toda a discussão que se tem em Portugal sobre a descolonização é que ela ainda assenta nesses preceitos e preconceitos colonialistas e racistas. Por exemplo, à esquerda, Daniel Oliveira diz que a descolonização "foi uma decisão que foi coletiva e largamente consensual: da esmagadora maioria dos portugueses que vivia na Metrópole, dos militares e de todos os políticos de então [...] Não seriam as exigências dos portugueses que viviam em África que poderiam prolongar por mais um dia essa guerra [colonial]." Isto é, a ideia de que a opinião (voto?!) dos "brancos-de-segunda" fosse para aqui chamada é inconcebível. À direita temos Henrique Raposo que nos diz também "meu caro amigo [retornado] tem de perceber que 'nem mais um soldado para África' não era um chavão da esquerda, era o sentimento genuíno da população." Isto é, os "brancos-de-segunda," mais uma vez, não são se quer concebidos como fazendo parte da população Portuguesa. A privação da cidadania desse grupo de cidadãos portugueses é ainda hoje internalizada---quero pensar de forma subconsciente---por comentadores Portugueses que respeito bastante tanto da esquerda com da direita! A elite de opinião política aparentemente unanime nunca percebe porque certos grupos se sentem marginalizados; a sua lógica negocia na linguagem do próprio disenfranchisement (privação de direitos) que nunca é repensada. Depois ficam admirados com a suposta falta de lógica daqueles que não se revêm na "unanimidade" de opinião---como no caso de Mário Soares e os retornados.
Mas se o tratamento euro-centrico foi mau para os "brancos-de-segunda," foi ainda muito pior para aqueles que são vistos como Africanos indígenas genuínos---como se brancos, indianos, chineses nascidos em África não o fossem também, ou, ainda pior, como se os "negros" fossem uma massa racial uniforme! Os Europeus formatados pelo nacionalismo dos séculos XIX e XX nunca perceberam a diversidade do continente e os comentadores políticos deste século usam ainda as categorias de pensamento herdadas dessa época. Daniel Oliveira diz "os povos africanos também tinham de se libertar." Quais povos africanos? A esquerda afinal aceita estados definidos racialmente? Ou só para o caso especial dos "africanos", essa conceção de uma massa escura uniforme herdada do colonialismo do século XIX? Ainda não internalizaram Nelson Mandela ou Albert Camus? Ou os Die Antwoord, Trevor Noah e Charlize Theron?
O que está aqui em causa é que os pensadores da nossa revolução, incluindo Mário Soares, pensaram e construíram a descolonização com preceitos colonialistas e racistas herdados do pior do colonialismo. Só contou a opinião dos brancos da metrópole. Os "brancos-de-segunda" tiveram que aceitar a opinião daqueles, baixando a bolinha como bons e dóceis trabalhadores da quinta que sempre foram. Quanto a todos aqueles que foram conceptualizados como africanos ("os escurinhos") que se entendessem entre si. Na realidade este laissez-faire Português do inicio da democracia representou um abandono da responsabilidade que Portugal, como governo das regiões africanas do seu império durante 500 anos, obviamente devia a todos os cidadãos da região independentemente da sua cor. Sim, o pai de Henrique Cardoso e os da sua geração queriam naturalmente o fim da guerra colonial, mas a responsabilidade criada durante 500 anos de regência não se esvanece num ano. Os Portugueses fugiram dessa responsabilidade escondendo-se atrás da mudança de regime. Mas essa é a grande hipocrisia do regime atual simbolizado por Mário Soares---aliás esta hipocrisia foi bem visível no seu funeral nos Jerónimos, esse grande símbolo do Império Português. Pois, a democracia chamou para si a grandeza dos símbolos do Império mas negou a responsabilidade que tinha sobre os povos de todas as raças que viviam sob a sua tutela durante 500 anos. Sim, queremos a Praça do Império de Salazar, mas não aceitamos qualquer responsabilidade do que se passou com os que não eram "brancos da metrópole" na altura da revolução. O que nunca se assume sobre esse abandono é que muito para além das misérias que os "retornados" passaram, a fuga das tropas Portuguesas (que de forma eficaz dominaram militarmente o produtivo território até 1974) levou em Angola a uma guerra civil entre povos africanos distintos (Ovimbundus, Ambundus, Bakongos, e outros) em que morreram mais de 500 mil civis, deixando um país corrupto em que a saúde e escolaridade infantil são do pior do Mundo!
Para que não haja dúvidas, não defendo de todo que Portugal se mantivesse como potencia colonial em Africa. Mas o que teria sido exemplar era ter considerado a opinião e o voto de toda a população no Império Português, mantendo-se a ordem por via militar até esse objetivo ser alcançado. 500 anos de domínio exigiam pelo menos uns 5 anitos de transição em que os direitos de cidadania de todos---brancos-de-segunda e indígenas---fossem considerados. A grande vergonha do regime democrático vindo da revolução Portuguesa foi que não garantiu, nem se quer tentou, a democracia para todos os seus cidadãos para além dos brancos da metrópole. As tropas Portuguesas nunca deveriam ter abandonado os territórios sem eleições locais, após exigir o cessar-fogo e desarmamento das fações militares para se atingir a independência. Isso teria sido exemplar.
O tal sistema unanime de opinião nacional mantém que uma transição mais suave não teria sido possível regionalmente. Por exemplo, Daniel Oliveira diz que algo como isto teria sido possível no inicio dos anos 60, mas não em 1975. Mas esse lugar-comum da opinião nacional nunca refere que em 1975 muitos dos vizinhos de Angola e Moçambique (Namibia, Africa do Sul, Zimbabwe/Rodésia) eram ainda colónias ou governados por minorias brancas---Zimbabwe fica independente em 1980, Namibia em 1990, e o Apartheid só cai em 1994! Isto é, havendo vontade política em Lisboa, teria sido possível um processo de descolonização de 5 ou mais anos com dignidade para todos. Se os revolucionários portugueses tivessem respeitado todos os cidadãos do Império, ao invés de olhar para o umbigo de Lisboa, Portugal poderia ter gerido apoio regional e internacional suficiente para uma descolonização diga desse nome, e não uma fuga irresponsável. Ter mantido a ordem militar um pouco mais, teria evitado uma guerra que matou mais de 500 mil civis em Angola---em comparação, a guerra colonial em todos os territórios matou 8 mil pessoas .
Deixo-vos com Die Antwoord, que só são possíveis devidos a um democrata que deve ser verdadeiramente respeitado por pensar em todos, não só no seu umbigo político e regional: Nelson Mandela. Se Soares (ou o sistema que representa) tivesse conseguido uma verdadeira descolonização democrática, a história vê-lo-ia hoje tão grande como Mandela---como o Pai de uma verdadeira democracia pós-racial no Mundo de expressão portuguesa. Mas não foi isso que aconteceu e a História sabe-o.
Labels: #Africa, #Angola, #Descolonização, #política, #portugal, #Revolução
2015-10-12
Union of European States for Expansionary Austerity
*Uma versão anterior do post usou um acrónimo mais correcto, mas mais complicado: UESEFC, for Union of European States for Expansionary Fiscal Austerity.
Labels: #Austerity, #EFC, #Euro, #politics, #portugal